julho 7, 2025

Cuidados veterinários idosos: monitoramento de SDMA e função renal na DRC

Cuidados veterinários idosos: monitoramento de SDMA e função renal na DRC

O manejo laboratorial e clínico em cuidados veterinários idosos é essencial para a detecção precoce, estadiamento e monitoramento das patologias prevalentes nessa faixa etária, permitindo intervenções terapêuticas oportunas e melhora da qualidade de vida. A senescência em pequenos animais ocasiona alterações fisiológicas complexas que modificam parâmetros bioquímicos, hematológicos e urinários, exigindo atenção especializada para interpretação dos exames complementares e sua correlação clínica. Através do diagnóstico laboratorial integrado, torna-se possível diferenciar mudanças esperadas da idade das manifestações patológicas, identificando disfunções orgânicas subjacentes e comorbidades, sendo crucial ao clínico veterinário um conhecimento aprofundado nas alterações fisiopatológicas inerentes ao envelhecimento e seu impacto nos principais sistemas orgânicos.

Alterações Hematológicas na Senescência e seu Significado Clínico

O envelhecimento do sistema hematopoiético em cães e gatos está associado a reduções discretas na capacidade proliferativa da medula óssea, que se refletem em normocitose com leve tendência à anemia leve a moderada, frequentemente normocrômica e normocítica, porém muitas vezes subdiagnosticada devido à ausência de sintomatologia aguda. Valores de referência para hemoglobina em cães idosos variam de 12 a 18 g/dL, e hematócrito entre 37% a 55%, sendo que percentuais abaixo desses podem indicar anemia crônica, deficiências nutricionais, ou estados inflamatórios persistentes.

Fisiopatologia da Anemia na Idade Avançada

Na geriatria veterinária, a anemia geralmente representa um quadro multifatorial, envolvendo processos inflamatórios crônicos que levam à anemia de doença crônica, resultante do aumento da produção de hepcidina pela inflamação, com consequente retenção de ferro no sistema retículo-endotelial e diminuição da eritropoiese medular. Além disso, a redução da produção renal de eritropoietina na insuficiência renal crônica é um fator crítico, especialmente em felinos idosos, em que a prevalência renal é elevada. O comprometimento da função imune também deve ser considerado, uma vez que processos infecciosos latentes podem agravar o quadro anêmico.

Parâmetros Hematológicos Complementares

O exame de reticulócitos permite diferenciar anemia regenerativa de não regenerativa, sendo que na senescência a tendência é para uma resposta pobre ou inadequada da medula diante da anemia. A avaliação diferencial de leucócitos pode demonstrar linfopenia relativa, devido ao declínio imunitário (imunosenescência), ou leucocitose discreta em processos infecciosos crônicos. Alterações na contagem de plaquetas são menos comuns, mas a trombocitopenia pode indicar disfunções imunes ou neoplasias hematológicas.

Perfis Bioquímicos e Fisiopatologia do Envelhecimento

Os perfis bioquímicos em animais geriátricos evidenciam alterações significativas que refletem disfunções hepáticas, renais e metabólicas que, somadas à senescência celular, impactam o metabolismo sistêmico. É imprescindível interpretar a elevação ou redução de enzimas e metabólitos dentro do contexto do envelhecimento e do quadro clínico, evitando diagnósticos incorretos somente com base em valores isolados.

Marcadores Renais e Avaliação da Função Excretora

A insuficiência renal crônica (IRC) é uma das patologias mais prevalentes em felinos idosos, mas também frequente em cães, caracterizada por a redução progressiva da taxa de filtração glomerular (TFG). Parâmetros como a ureia sanguínea ( valor de referência: 25-60 mg/dL em cães; 20-50 mg/dL em gatos) e creatinina sérica ( 0,5-1,4 mg/dL em cães; 0,8-2,0 mg/dL em gatos) apresentam elevação progressiva conforme a perda da função renal, porém seu aumento ocorre tardiamente, quando a perda da TFG supera os 75%. Desta forma, a medição da SDMA (dimetilarginina simétrica) tem se mostrado mais sensível para detectar disfunção renal em estágios precoces, com valores acima de 14 μg/dL sugerindo comprometimento.

Alterações Hepáticas e Enzimas de Lesão

Metabolismo hepático sofre alterações por diminuição no fluxo sanguíneo, redução da massa funcional e alterações na capacidade de regeneração. Enzimas como ALT (alanina transaminase) e ALP (fosfatase alcalina) apresentam variação comumente associada a doença hepática crônica, colestase ou indução enzimática medicamentosa. Valores de referência de ALT em cães são entre 10-125 U/L e em gatos 20-100 U/L. A ALP pode estar discretamente elevada em cães idosos sem evidência patológica devido à isoenzima óssea relacionada a remodelação esquelética intensa em doenças articulares degenerativas comuns na idade avançada.

Distúrbios Metabólicos e Perfil Lipídico

O envelhecimento promove alterações metabólicas, como a resistência insulínica, predispondo a condições endócrinas como diabetes mellitus, mais frequente em cães idosos. É essencial dosar glicemia de jejum ( 70-110 mg/dL em cães; 70-150 mg/dL em gatos) e realizar testes de tolerância à glicose quando indicado. Dislipidemias secundárias refletem Gold Lab Vet qualidade alterações hormonais e nutricionais, e exames de colesterol e triglicerídeos ajudam no diagnóstico e acompanhamento, sendo comum encontrar hipertrigliceridemia discreta em animais geriátricos devido a metabolismo lipídico alterado.

Perfil Urinário e Avaliação da Função Urinária no Idoso

O exame de urina em animais idosos fornece informações fundamentais para o diagnóstico precoce de doenças renais e urinárias, sendo sensível às alterações estruturais e funcionais do trato urinário. A interpretação deve considerar fatores como concentração urinária, presença de proteínas, células e cristais, que podem indicar patologias subjacentes ou consequências da senescência.

Concentração Urinária e OsMolalidade

Animais geriátricos apresentam frequentemente incapacidade da medula renal de concentrar urina, refletida pela densidade urinária abaixo dos valores normais ( densidade urinária ideal >1.030 em cães; >1.035 em gatos). Tal alteração pode representar um comprometimento tubular inicial, típicos da insuficiência renal crônica, e constitui um marcador sensível para avaliação da função tubular, sendo fundamental na estratificação do estágio renal.

Proteinúria e sua Interpretação Diagnóstica

A presença de proteínas na urina em níveis elevados (>30 mg/dL ou relação proteína-creatinina urinária acima de 0,5 em cães e 0,4 em gatos) é indicativa de glomerulopatia ou lesão tubular. Na geriatria, o aparecimento de proteinúria deve ser interpretado minuciosamente para diferenciar causas prerenais, renais e pós-renais, além de sua relação com processos inflamatórios crônicos, neoplasias e doenças sistêmicas como hipertensão arterial sistêmica, comum em gatos idosos.

Urêmia e Marcadores de Comprometimento

Além dos marcadores bioquímicos, o exame sedimentoscópico pode revelar cilindros hialinos ou granulocíticos, sugestivos de necrose tubular ou inflamação renal ativa. A associação desses achados com sinais clínicos e exames laboratoriais amplifica o diagnóstico de doença renal avançada e permite o monitoramento terapêutico eficiente em cuidados veterinários idosos.

Marcadores Inflamatórios e Imunológicos no Diagnóstico Geriátrico

Processingamento do sistema imunológico em pequenos animais idosos apresenta declínio da resposta adaptativa e aumento de inflamação basal crônica, caracterizada como inflamação de baixo grau, denominada inflammaging. O conhecimento das alterações imunológicas e dos marcadores inflamatórios é crucial para o diagnóstico laboratorial e interpretação clínica das condições sistêmicas nos pacientes geriátricos.

Proteína C Reativa e Fibrinogênio

O aumento de proteína C reativa (PCR) e fibrinogênio no plasma são indicativos de processo inflamatório ativo. Em idosos, valores de PCR acima de 10 mg/L e fibrinogênio acima de valores de referência ( 200-400 mg/dL) sugerem estados infecciosos, neoplásicos ou inflamatórios crônicos, porém devem ser correlacionados com o quadro clínico para evitar interpretações equivocadas em função da inflamação basal leve associada à idade.

Imunosenescência e Alterações Linfocitárias

A diminuição progressiva dos linfócitos T, especialmente do subtipo CD4+, e o aumento relativo de células senescentes prejudicam a resposta imune, facilitando infecções oportunistas e piora da prognósticos em doenças infecciosas crônicas e neoplasias. Hemogramas com linfopenia persistente em geriatria devem ser avaliados com cautela para investigação complementar de enfermidades infecciosas, imunossupressão ou neoplasias hematológicas.

Diagnóstico Laboratorial Integrado e Monitoramento Terapêutico

O diagnóstico laboratorial no cuidado veterinário de animais idosos deve sempre ser integrado e contextualizado, combinando dados hematológicos, bioquímicos, urinários e imunológicos para caracterizar o quadro clínico completo. Essa abordagem possibilita o diagnóstico precoce de doenças crônicas, a estratificação do paciente para planejamento terapêutico e o acompanhamento da resposta ao tratamento.

Interpretação Cinética e Avaliação Longitudinal

Análises seriadas são indispensáveis para acompanhar a progressão do quadro e a eficácia das intervenções terapêuticas. A comparação dinâmica de parâmetros como creatinina, SDMA, níveis de proteína C reativa e densidade urinária permite o ajuste do manejo clínico, identificação precoce de complicações e consequente melhora no prognóstico.

Abordagem Multissistêmica e Considerações sobre Comorbidades

Pacientes geriátricos apresentam alta prevalência de comorbidades, como doenças osteoarticulares, cardiovasculares, metabólicas e neoplasias, inclusive em estágios subclínicos, que interferem nos resultados laboratoriais e no prognóstico. O exame laboratorial deve refletir essa complexidade, demandando interpretação crítica e análise contextualizada para evitar diagnósticos parciais e tratamentos inadequados.

Resumo Técnico e Considerações Clínicas Práticas

O cuidado laboratorial em animais geriátricos repousa na compreensão das alterações fisiopatológicas naturais do envelhecimento, que impactam os principais sistemas orgânicos e refletem em parâmetros laboratoriais. Hemogramas frequentemente mostram anemia normocrômica, regulada pela eritropoiese comprometida e inflamação crônica. Bioquímicas revelam comprometimento renal precoce detectável pela SDMA e alterações hepáticas multifatoriais, enquanto o exame urinário enfatiza a importância da avaliação da concentração e proteinúria na estratificação da insuficiência renal. Marcadores inflamatorios laboratoriais auxiliam no reconhecimento de processos infecciosos e neoplásicos, frequentemente associados à imunosenescência. O diagnóstico laboratorial deve ser integrado, longitudinal e contextualizado para garantir um manejo clínico especializado.

Considerações clínicas aplicáveis: Sempre correlacione os resultados laboratoriais com o estado clínico e histórico do paciente; realize avaliações periódicas para monitorar progressão e resposta terapêutica; priorize exames sensíveis como SDMA para detecção precoce de disfunção renal; investigue proteinúria persistente para evitar evolução silenciosa de glomerulopatias; tenha em mente a possibilidade de múltiplas comorbidades; ajuste protocolos terapêuticos considerando alterações farmacocinéticas na geriatria; e utilize marcadores inflamatórios para diferenciar causas infecciosas de processos puramente senescentes. Essa abordagem otimiza o cuidado e prolonga a qualidade de vida dos pacientes idosos no ambiente clínico veterinário.

Facilitadora de inspirações amante de transformar informação em inspiração. Mentora do projeto.